segunda-feira, 1 de setembro de 2008

A casa do futuro, a casa no futuro

( a propósito de um convite que me foi formulado por uma turma do 12º ano do colégio de Albergaria....)




Ter uma conversa sobre o modo como será a habitação no futuro não é um exercício de futurologia.
Porque...
A minha profissão resulta da necessidade de "projectar". Nesta profissão de arquitecto, assim como noutras cuja função primordial é projectar - isto é, parametrizar uma realidade que se vai construindo do virtual ao real, através de um processo sistémico, dinâmico e evolutivo, obtêm-se uma consciência muito próxima do que poderá vir a ser uma realidade futura.

( esqiço do arq. Siza Vieira)

Por uma questão de racionalidade prefiro colocar esta realidade futura num futuro próximo, um futuro que se vê... que resulta das nossas atitudes no presente. Falar da casa do futuro daqui a quinhentos ou mil anos será exercício de ficção científica.

Deste modo, analisando um pouco do processo evolutivo no presente, podemos ter uma ideia mais ou menos fundamentada de como será a casa no futuro, pois racionalmente podemos fazer o exercício de projectarmos nós próprios a casa do futuro, tendo próxima a noção de como será o Homem a quem se destina a casa, de como se processam as técnicas construtivas, e de como será o suporte físico natural, ( a envolvente com o território) nesse futuro.


Como será fácil de aceitar, a casa depende sempre de três factores primordiais: A terra, a Técnica e o Homem. Por outras palavras, as casas e as construções humanas resultam de um processo onde se sintetizam aspectos antropológicos, aspectos ecológicos e aspectos técnicos.



Assim, para pojectarmos a casa do futuro temos que conhecer o homem do futuro teremos que saber como se relaciona o homem com o Território no futuro e temos de procurar antecipar o desenvolvimento tecnológico no futuro.


Ainda, e para além dos aspectos funcionalistas e mesuráveis, a síntese resultante pode materilizar uma expessão artística, uma obra de arte. Sendo este um aspecto fundamental da arquitectura e que a distingue de outras actividades relacionadas com a construção, entramos num território muito mais difícil de antecipar. Ou talvez não. Mudou o homem assim tanto ao longo dos tempos?


Portanto, a casa do futuro, deste futuro que se vê, e que é o que nos interessa, resultará do que nós fizermos no presente.
No presente, os nossos padrões de desenvolvimento, as políticas económicas e os modelos de consumo cada vez mais sedutores resultam numa proliferação desmesurada de modelos que nos fazem crer que já vivemos no futuro e que o futuro é hoje. Queima-se assim uma etapa importantíssima do nosso tempo que é o presente. E O PRESENTE É HOJE.

O que se passa hoje?
O panorama que eu vejo é preocupante.
Os nossos paradigmas de desenvolvimento baseiam-se na constante procura de bens, na constante exploração de recursos, na acumulação constante de resíduos resultantes deste processo ( a que chamamos consumismo).
Por outro lado os recursos como sabemos não são inesgotáveis...

O fenómeno de produção de casas nas sociedades mais liberais e estabilizadas sob o ponto de vista demográfico acompanha este fenómeno de aceleração desmesurada do consumo.
A oferta e colocação de casas no mercado ultrapassa de longe as nossas necessidades. Em Portugal já há duas vezes mais casas do que o necessário para a população portuguesa.
Por outro lado na China, no Dubai, o frenesi construtivo está a crescer a um ritmo fenomenal porque muita população necessita de casas, por um lado ( China) e por outro a especulação e a mobilidade nos paises asiáticos promove o desenvolvimento de modelos de vida similares aos padrões Ocidentais.( Dubai).

Mas, voltando ao princípio, o que é uma casa?
A casa é, neste processo e independentemente dos variados modelos, uma construção humana cuja função primordial é o ABRIGO permanente.


Como será fácil de reconhecer, dos inúmeros modelos de casa e construções que foram sendo edificadas nas mais diversas partes do globo e ao longo do TEMPO, poderemos detectar grandes diferenças, desde as construções em terra do Mali até aos igloos dos esquimós, passando pelas grandes construções do egipto até ás fantásticas casas dos romanos, aos palácios do Rajaquistão até às casas de vidro de Mies Van der Rohe , etc etc, ...
Temos portanto que de cada contexto de desenvolvimento técnico, de cada contexto de materiais disponíveis e de cada contexto antropológico resulta uma determinada casa, um determinado abrigo.
Durante séculos o processo de construir resultava dos contextos locais e deste modo se fortaleceram métodos e técnicas e tipologias intimamente relacionadas com o território e imediatamente identificáveis e localizadas.
No entanto, a globalização e as tecnologias de comunicação, aliadas a um desenvolvimento que inicia os primeiros passos na aplicação de novos materiais, menos predadores do ambiente, o surgimento de novos “modus vivendi” resultantes de rupturas nos padrões tradicionais da estruturação social, assim como a feroz agrassividade da indústria da construção e concepção de novos espaços, faz com que vivamos uma espiral de criatividade na concepção de novos modelos construtivos.

casas flutuantes

O maior edifício do mundo ( Foster and partners)
O que fazer então em relação ao futuro?

Dizia o sociólogo Boaventura de Sousa Santos : "Um dia teremos que inventar, sempre com atrazo, o que tinhamos quando eramos atrazados".

Lembro Buckminster Fuller, ”, uma das mentalidades mais originais e fascinantes do séc. XX, que nasceu em 1895 na cidade de Milton, Massachusetts, criador da frase e do conceito “ NAVE ESPACIAL TERRA".

Considerado o “último dos transcendentalistas” , Fuller rejeita as religiões estabelecidas e as nocões políticas do passado aderindo a um sistema de pensamento idealista, baseado na unidade essencial do mundo natural e à utilização do experimentalismo e da intuição como meios para a compreensão desse mundo.
Defendia que só através de um profundo conhecimento da tecnologia e da ciência a humanidade encontraria princípios e regras estruturantes do indivíduo numa conduta para a salvação da sociedade.
Buckminster Fuller ( “Bucky”) dizia : " o Homem sabe tanto, tanto, mas faz tão pouco..."



O Futuro constrói-se hoje


Helder Ventura, arquitecto.